"O grande responsável pela situação de desequilíbrio ambiental que se vive no planeta é o Homem. É o único animal existente à face da Terra capaz de destruir o que a natureza levou milhões de anos a construir"





domingo, 20 de outubro de 2013

Arum italicum (Miller)

Nomes comuns:
Alho-dos-campos; Arrebenta-boi; Bigalhó; Candeias;
Erva-da-novidade; Sapintina; Serpentina; Serpentinola; Jairo;
Jaro; Jarreiro; Jarro; Jarro-bravo; Jarro-comum; Jarros-dos-campos


Arum italicum é uma magnífica espécie de origem europeia que cresce de forma espontânea em bosques e sebes por toda a região mediterrânica ocidental (mais concretamente sul da Europa, incluindo Ilhas Britânicas, até ao norte de África), particularmente em locais húmidos ou sombrios.
Distribuição em Portugal
Fonte: Flora Digital de Portugal/UTAD
Aparentado com o famoso jarro (Zantedeschia aethiopica), planta exótica importada da Africa do sul e que é bastante comum em muitos jardins do nosso país, o Arum italicum não goza, entre nós, da mesma popularidade.
Zantedeschia aethiopica
Será talvez por desconhecimento porque em certos países do norte da Europa, como é o caso do Reino Unido, apreciam-no a ponto de comercializarem os seus rizomas cultivando-o amorosamente em canteiros de jardim e em vasos.
O interesse por esta espécie reside na forma e coloração das suas luxuriantes folhas (as quais se mantêm verdes durante todo o inverno), na forma bizarra das suas inflorescências e na cor avermelhada dos seus frutos. Esta espécie cresce particularmente bem e uma vez estabelecida dá origem, em poucos anos, a colonias alargadas.
A planta reproduz-se quer por divisão dos rizomas quer por sementes e pode tornar-se invasiva se as condições lhe forem propícias, sendo difícil de erradicar pois qualquer pedacinho de rizoma que fique na terra dá inevitavelmente origem a uma nova planta (o mesmo acontece com o jarro Zantedeschia aethiopica, típico dos nossos jardins). É também uma espécie muito variável podendo apresentar folhas de aspeto marmoreado, principalmente na falta de luminosidade.
Quando chega o outono o Arum italicum produz, diretamente de um rizoma, um pequeno grupo de grandes folhas sagitadas (em forma de ponta de seta), verdes e lustrosas as quais estão providas de longos pecíolos de cor verde claro. As folhas permanecem na planta durante todo o inverno e parte da primavera após o que ficam meladas e acabam por apodrecer, o que muitas vezes acontece ainda durante a floração.
As flores de Arum italicum, reunidas numa inflorescência racemosa (dispostas em torno de um único eixo), surgem em finais de março ou inícios de abril. Esta é uma espécie monoica em que coexistem flores masculinas e flores femininas, as quais são desprovidas de perianto (pétalas ou sépalas).
À primeira vista, a inflorescência de Arum italicum, apesar do seu aspeto peculiar, parece banal. No entanto a sua estrutura é muito complexa e extremamente especializada. É essencialmente composta por duas partes: o espadice e a espata.
O espadice é uma estrutura de eixo cilíndrico, de cor amarelada, espessa e carnuda em cuja parte inferior se apinham as pequeníssimas flores, dispondo-se em anéis onde flores férteis e flores estéreis se intercalam. As flores femininas férteis estão inseridas na parte mais inferior do espadice seguidas de um espaço preenchido com flores femininas estéreis que se reconhecem por terminarem num apêndice filiforme. Por cima dispõem-se as flores masculinas férteis e acima destas existe um novo anel desta vez composto por flores estéreis masculinas, igualmente providas de apêndices filiformes. A partir daqui o espadice alarga formando uma espécie de bastão ou clava, de ápice arredondado o qual serve de chamariz aos polinizadores devido ao odor fétido que exala durante a floração.
A espata é uma bráctea de grande limbo de forma lanceolada, com a extremidade aguda e ligeiramente curva, de cor branco-esverdeada ou verde-amarelada; a sua parede interna é muito lisa e também oleosa devido a secreções das glândulas existentes na epiderme.
A espata protege o espadice envolvendo-o completamente até a floração. Nessa altura a espata abre-se revelando apenas a parte superior do espadice; as flores ficam escondidas na sua base, numa zona tubular que forma uma espécie de camara armadilhada para “benefício“ dos polinizadores.
O sistema de polinização é bastante interessante e sofisticado, contudo dele resulta um elevado gasto de energias e que tem como consequência a degenerescência precoce de algumas partes da planta, nomeadamente folhas, espata e parte superior do espadice. É, no entanto, extremamente eficaz na promoção da polinização cruzada, preservando a variabilidade genética da espécie e daí o seu sucesso na reprodução de novos indivíduos saudáveis.
Foto cedida por JARDIN MUNDANI - Veja AQUI
Quando as flores femininas ficam maduras a temperatura do espadice aumenta sensivelmente em relação à temperatura ambiente, podendo chegar a uma diferença de cerca de 6 graus C ou mais, o que representa um gasto tremendo de energia. Este aumento de temperatura ajuda a volatilizar os compostos químicos produzidos pelo espadice acentuando o odor fedorento por ele produzido. Atraídos pelo seu cheiro favorito (gostos não se discutem…) os insetos polinizadores, geralmente moscas, tentam poisar nas paredes escorregadias da espata mas acabam por cair inadvertidamente no interior da camara onde se encontram as flores. Os apêndices filiformes das flores estéreis deixam passar os insetos mas impedem-nos de sair pelo que estes permanecem prisioneiros no fundo da camara onde estão as flores femininas. Debatendo-se para sair os insetos acabam por espalhar sobre elas o pólen obtido numa outra inflorescência, fecundando-as. Para reforçar o processo as flores segregam néctar o que persuade os insetos a deslocarem-se de flor em flor, procurando alimento. Quando as flores femininas estão fecundadas deixam de produzir o precioso líquido pelo que os insetos se atropelam procurando a saída, a qual é agora possível pois entretanto os apêndices filiformes das flores estéreis murcharam. Porém, é a altura de as flores masculinas férteis ficarem maduras e uma vez que o caminho de saída inclui passagem obrigatória pelos estames, os insetos saem carregados de pólen que irão deixar noutra flor, recomeçando o processo de polinização.
Terminada a polinização, a espata e a parte superior do espadice apodrecem e caiem ficando apenas as flores femininas que se transformam em frutos, primeiro de cor verde e depois vermelha, geralmente por alturas de junho.
Todas as partes de Arum italicum contêm compostos químicos que o tornam potencialmente tóxico, nomeadamente cristais de oxalato de cálcio (curiosamente os mesmos que formam os cálculos renais); estes componentes tóxicos podem ser neutralizados se cozinharmos a planta. Se ingerida em cru causa uma sensação de queimadura na boca e garganta com inchaço e asfixia, podendo causar a morte. No entanto os casos de intoxicação são raros pois o gosto amargo dos frutos e outras partes da planta são bastante dissuasores. Aparentemente até os roedores as acham intragáveis.
O Arum italicum pertence ao género Arum o qual se inclui na família botânica Araceae constituída por cerca de 4000 espécies, muitas delas de grande impacto no comércio mundial sobretudo nos setores de floricultura e alimentar. Muitas espécies são cultivadas e usadas em decoração de interiores e em espaços ajardinados em locais de meia sombra, nomeadamente cultivares dos géneros Dieffenbachia, Philodendron,  Anthurium,  Alocasia, apenas para referir alguns dos mais conhecidos entre nós.

Fotos: Serra do Calvo/Lourinhã (exceto as gentilmente cedidas por Jardin Mundani)



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